sábado, 4 de maio de 2013

" Cena marcante que me fez médico"



Dr. FRANCISCO ORNIUDO FERNANDES - Médico Infectologista
                                                                              orniudo@uol.com.br

     A noite do dia 19 de abril de 1954 é inesquecível para mim. Estava dormindo em uma rede, no mesmo quarto onde também dormia a minha irmã, Maria Cândida. O aposento ficava ao lado do dormitório de nossos pais, separado apenas por uma porta, que ficava sempre fechada.
     De madrugada, fui acordado por minha irmã que chorava e sacudia o punho e a varanda da rede exclamando que mamãe estava passando muito mal! Acordei atônito sem saber direito a dimensão o que estava acontecendo, porque não tinha noção, nem conhecimento da gravidade do quadro. Era uma criança, tinha apenas sete anos e quatro meses de idade. Imediatamente fui conduzido para o quarto onde pude presenciar a situação agonizante de minha genitora, sentada no leito, cansada, e, eliminando pela boca, grande quantidade de secreção espumosa avermelhada.  Vi depois, ela segurar com muita dificuldade em suas mãos, um quadro que continha a fotografia e a benção do Papa Pio XII. Após beijá-lo, deixou cair no chão espatifando-se o vidro.
     O meu pai muito aflito pediu para a minha irmã ir correndo chamar o único médico da localidade, o Dr. Osvaldo Bezerra Cascudo, que morava em uma rua próxima a nossa casa. Enquanto aguardava a sua chegada, ele preparou uma ventosa, para aplicá-la na região torácica posterior.
     Para preparar a ventosa, tomou em suas mãos um copo, deixou queimar um chumaço de algodão no seu interior, e, depois de apagada a chama, aplicou-o no dorso do tórax.
     Assistia tudo sem ter nenhuma noção que aquele momento era o instante final junto a minha querida mãe. para mim o primeiro contato com uma pessoa que precisava urgentemente de um socorro médico. Soube anos após o seu falecimento que mamãe era portadora de insuficiência cardíaca grave, e, que a sua causa mortes foi um edema agudo de pulmão. Esta imagem foi marcante em  minha vida, e, sem dúvida, o passo inicial de minha carreira médica. 
     Procuro quando atendo os meus doentes,  vê-los como um ser humano que necessita além do apoio profissional, do afeto e, sobretudo o respeito. Trato-os como se fora alguém de minha estimação.